terça-feira, 9 de abril de 2013

As cotas deram certo!


As pessoas acreditam que existe uma classe dominante porque um grupo de pessoas de maneira presunçosa e arrogante se impõe no poder, algo que é fácil perceber e supostamente fácil de reagir contra. Porém não é assim. A classe dominante existe com seus poderes e consequentes privilégios porque a classe subalterna, da qual eu faço parte, justifica os privilégios da elite.

Todo mundo acha absurdo fome, gente sem terra, sem teto, sem sub-escolarizada, etc. Muita gente acredita que isso existe porque tem gente que tá comendo demais, tem terra demais, tem casa demais, porque falta escolarização, etc. Muita gente pensa que os ricos deveriam ceder em seus privilégios e pensar mais no próximo, para que essas coisas tidas como injustas desapareçam. Às vezes a elite, até por um pequeno senso de humanidade também pense e concorde com isso, porém tudo muda, entre pobres e ricos quando alguma ação prática é tomada para mudar isso.

Por isso quando se fala em impostos sobre grandes fortunas, reforma agrária, aluguel social compulsório dos imóveis ociosos, cotas nas universidades federais todos são contra. Os ricos a gente entende, vão perder privilégios e pensam que alguém, que não deve ser eles tem que pagar a conta. Agora os pobres se põem contra por quê?

Existe alguns mitos em nossa sociedade pós iluminismo, o de que todos nós somos iguais e temos direitos iguais. Por isso, por exemplo, justificamos com tanto afinco a propriedade privada, pois foi dito que todos nós, mesmos os quem não têm a possibilidade de ter um palmo próprio de terra ou quem tem muito mais do que precisa para viver, tem esse direito. A propriedade privada muita gente não terá condição de ter, mas o direito de tê-la um dia sim. Por isso muito pobre acha o MST um bando de vagabundos.

Quem disse isso aos pobres foram os ricos e assim os ricos não se desgastam, pois os pobres tratam de conservar os próprios privilégios da elite, sem parecer que são da elite. Graças a isso, pude notar que no colégio público em que dou aula, uma significativa parcela dos meus alunos da Educação de Jovens e Adultos é contrária à existência das cotas, pois, na minha opinião, eles aceitaram o discurso de que existe igualdade entre um estudante do Colégio Estadual Joaquim Edson de Camargo e um discente do Colégio Visão, do Setor Bueno em Goiânia. Além do mais, eles acham que exista uma democracia - na verdade não acham democrático o vestibular, acham justo, pois alguns ainda não foram esclarecidos que democracia não é apenas o direito a voto - no vestibular.
 
Porém, as utopias sociais, como a da igualdade de condições existente no capitalismo, vão caindo por terra hora ou outra, sendo que nesta semana a revista IstoÉ trouxe uma reportagem estampada em sua capa para atestar que a Cotas deram certo e que todos reacionários argumentos da elite que a massa repete de maneira acrítica foram derrubados. Não, os cotistas não abaixaram o ponto de corte de em nenhum sentido relevante, não reduziram o rendimento dos cursos, tem desempenho semelhante ou superior, tem baixíssimo abandono ou mudança de curso e a grande maioria está empregada após concluir os cursos.

Minha função como professor nesta história, além de não ter publicado este texto sem antes revisá-lo, desculpe a minha falta, penso ser levar aos meus estudantes a informação, acirrar as críticas que eles tem sobre o assunto e permitir que eles cheguem a própria a autônoma conclusão sobre as cotas raciais. Portanto, a revista IstoÉ será o meu material de apoio dos meus próximos planos de aula.

domingo, 7 de abril de 2013

Daniela Mercury na grande imprensa

Comprei as revistas Veja e Época desta semana. As duas colocam a revelação do casamento homoafetivo da Daniela Mercury como tema de suas capas. A revista Época tratou a revelação da cantora como um ato político, em tempos em que discurso reacionário ganha força, mas enfatiza o Brasil como um país na rabeira dessa evolução. Ressaltou que o "outing" já é tradição na Europa e nos EUA e talvez agora seja no Brasil. A revelação da sexualidade da cantora enriquece o debate e incentiva a sociedade a pensar mais sobre a diversidade existente em nossa sociedade. A Veja surpreendeu, a revista que penso ser a mais inconfiável entre as semanais, inclusive porque historicamente sempre deturpou a questão LGBT, relativizando o assunto, empobrecendo o discursos ou tornando toda articulação política como algo irrelevante, coisa do governo que ela tanto crítica, mostrou que a questão homoafetiva segue um caminho irreversível de aceitação. A revista exemplificou com fotos a luta das mulheres pelo direito ao voto e de outras, católicas, conservadoras, contrárias ao divorcio, direitos que hoje, em 2013, são inquestionáveis em suas justiças e necessidades, apesar de tudo que fora dito no passado para criticar as suas criações. A Veja exemplificou também mostrando o caso de famílias bem sucedidas que são homoafetivas.

E hoje, aqui em casa, a revista IstoÉ, a qual assino, dizendo "As cotas deram certo" e embaixo do título as justificativas. Ainda não li a notícia, mas...

É bem verdade que os conservadores e as pessoas que possuem uma opinião mais ignorante sobre o tema, travestida de indignação de um cidadão que não aceita essas diferenças, não na frente de suas crianças, possam dizer que tratam de caprichos, de propaganda, como se eles o tempo todo também não fizessem, principalmente em seus programas religiosos. Mas o que é fato, as mudanças estão vindo e só restam a essas pessoas se contentar com isso, do mesmo modo que tiveram que se contentar com o divórcio, com os direitos femininos, com o fim da escravidão, com a separação da Igreja e do Estado. Enfim, vocês vão perder outra vez, a sociedade ganhará princípios mais iluministas e o apocalíptico fim dela que os reacionários tanto prometem, outra vez será adiado para a próxima data profética.

quarta-feira, 27 de março de 2013

Imigrantes, não!


A próxima pérola de Brasília é a criação de uma agência para facilitar a vinda de imigrantes para o país. O Governo Federal quer trabalhadores qualificados em um país que tem uma legião de gente que é sub-alfabetizada porque educação nunca foi levada a séria por aqui. Nunca teve escola que prestasse e como número sempre foi mais importante para os proselitismos eleitorais, temos números feitos para maquiar as pessoas sub-intelectualizadas a despeito dos anos nominais de estudos. Além disso, o Brasil quer dar justamente os melhores empregos, os com as melhores rendas para as pessoas que não são daqui e que nos países delas há uma década tratava a gente feito cães vira-latas. Sem contar que temos uma legião de gente miserável e que nunca pisou em uma escola técnica ou em uma universidade porque nunca teve oportunidade, pois todas as maneiras de se chegar lá fazem do caminho excludente.
Mas ainda tem gente querendo isso, principalmente os empresários que cujo conceito de desenvolvimento nacional perpassam apenas os lucros imediatos de suas corporações. E assim vamos achar bonito, nossa ânsia de ser país rico, apesar de sermos pobre e feio, quer é isso, um monte de gringo para ver se a gente fica bonito. Ora, dona Dilma Rousseff, se a senhora quer mais mestres e doutores aumente as vagas nas universidades federais para os referidos programas de extensão. Tem muito auxiliar de serviços gerais precisando e que pode virar dotô nesse país. Só não esqueça a senhora e sua equipe de governo, bem como aquela outra a corja que fica nos estados, os governadores, que um país para se escolarizar precisa de professores e nisso seus proselitismos tem trabalhado muito bem para que tenhamos um apagão docente nas próximas décadas!

sábado, 23 de março de 2013

A falsa crítica de Rachel Sheherazade

Mentira, Rachel Sheherazade! Essas pessoas que você disse que não sabem o que é democracia não estão perseguindo o deputado Marco Feliciano. Pelo contrário! É o deputado Marco Feliciano que as perseguem! Os movimentos sociais criticam o deputado por seus posicionamentos preconceituosos e suas ações intolerantes e inflexíveis a respeito dos grupos aos quais a comissão que ele quer presidir foi criada para proteger!

Ninguém está questionando o fato do deputado ser pastor, muito embora tenha sido ele quem tenha buscado votos usando como argumento as suas convicções pessoais, assim também como é ele quem usado o tão falado Estado laico para criar regras e restrições para outras pessoas tendo como base a fé que é dele e de seus eleitores. Soma-se se a isso o fato que democracia no caso do Brasil não representa tão somente a vontade da maioria, significa igualdade e garantia de direitos para que todos possam exercê-la, coisa que Marco Feliciano quer impedir que exista quando pretende perpretar preconceitos e tratamentos de segunda classe para os grupos com os quais ele não se identifica. 

Por fim, o fato de Marco Feliciano ser um deputado não dá a ele salvo conduto para que ele faça o que bem entender. Ele deve dar satisfações à sociedade e está tem o direito de se indignar, não reconhecê-lo e exigir a sua saída, como é o caso. Nenhum político é dono do cargo que ocupa e faz o que bem entende, se não fosse assim não teríamos tirado Fernando Collor de lá, ou a jornalista acha que ele devia continuar? Assim também como as liberdades de pensamento e religiosa dele não são maiores que os direitos de igualdade, dignidade, pluralidade, fraternidade e respeito, que o deputado não enxerga nos outros. Nenhum direito em nosso país é maior do que outro, pois todos eles são iguais para que todos possam existir de maneira plena sem ser engolido por outro.

Quem precisa de uma lição de democracia é a senhora, com sua visão míope e superficial a respeito da mesma. Além disso, precisa aprender mais sobre ética no jornalismo, coisa que um leigo como eu sabe apenas que você não tem, uma vez que não considerou todos os aspectos antes de emitir sua opinião e sair em defesa do indefensável, o referido deputado Marco Feliciano.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Quando um aluno me matou


Hoje recebi a notícia de que uma aluna da Educação de Jovens e Adultos morreu. A notícia me deixou despontado de verdade. Tenho simpatia pela EJA não só pelo fato de os alunos serem adultos, de pouco ser necessário chamar a atenção a respeito da disciplina deles, porque no geral eles se interessam pelo o que eu tenho a dizer, não tenho que tentar explicar para eles qual é a importância daquilo, mas também pelas suas trajetórias de vida. Muito estão lá às custas de relevantes sacrifícios pessoais, encaram a volta à escola como uma oportunidade de se tornarem pessoas melhores do que eles são, potencializar novos sonhos, ser o que um dia nunca foram e ou que muito cedo foi lhes tirado a oportunidade. Muitos chegam a minha aula pensando que concluído o 4º Semestre terão concluído a sua formação acadêmica, porém esforçamos para mostrar a muitos que aquilo é só o começo se eles quiserem mais.
Por isso me comovo, me apego e torço por pessoas que se parecem com meus pais, pela idade e pela vivencia, por pessoas que aos mais de 50 anos vida carregam a família nas costas, suporta violência familiar, doenças e destrato da saúde pública, ônibus lotado, faz uma rotina tripla, estuda e ainda por cima consegue notas e desempenho exemplares. Porém, saber que a pessoa morreu, mesmo que de maneira não muito dolorosa - "ela dormiu e não acordou mais" - é frustrante. Investimos neles os recursos públicos, mas também nossos anseios de professor e pessoa humana. Tudo o que a gente mais quer então é que alunos assim se deem bem, recebem uma recompensa da vida por seus esforços, ganhem da vida a outra face da moeda, a de que eles podem ir além do que já são e serem felizes. Mas vem a morte, com toda sua intransigência e frustram suas vidas e a gente também, por que não?
 Dona Cleide Moura, a senhora me ensinou muito mais coisas sobre a vida do que eu te ensinei sobre Geografia. Parabéns por ter lutado como uma guerreira! Lembrarei da senhora, seu semblante, sua feição humilde mas esforçada por toda minha vida.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Um ode(ie) ao funk e ao arrocha


Hoje no último horário coloquei algumas músicas brasileiras sobre a mulher. Não não, não coloquei o Ensino Fundamental para ouvir Caetano Veloso, até eu que tenho que dar aula em três turnos hoje morreria de sono. Peguei músicas nacionais, das mais recentes a no máximo dos anos 80, do rock, falando sobre as mulheres e promovendo suas personalidades. Rolou J Quest, Rita Lee, Charlie Brown, Capital Inicial, Skank, Pitty, O Rappa, Engenheiros, enfim. Os alunos a todo momento apareciam com seus pen drives, que a julgar pelo gosto musical deles deveriam estar infestados de vírus, e pediam que eu colocasse Mc Catra, funk, arrocha, Gustavo Lima, e afins. Eu respondia com um irônico mas cordial não a todos. Em outros eu dava tapinhas nas costas e mandava ir prestar atenção na música.

Bom, nenhum deles gostaram disso e reclamaram não estar gostando, pelo menos muitos deles manifestaram isso e ninguém em contrário. Ana Carolina e eu continuamos com o rock. Ao final quando tocou o sinal todos foram embora e os alunos passavam por mim reclamando:
- Nossa professor, como suas músicas são ruins.
E eu prontamente respondia:
- Sério? - de um jeito que só quem me conhece pessoalmente sabe como eu falo.

Não, não se trata dessa narrativa uma crônica sobre conflito de gerações. Aliás, acho isso bem cafona, repetitivo e por assim dizer, superficial. Até mesmo porque eu deleito em meus 23 anos e sendo assim penso inexistir um conflito de gerações de verdade. A juventude, a qual faço parte, é sempre vista como idiota, alienada e inútil pelas gerações mais velhas. Mas quero apenas citar um exemplo de como a inteligência é outra dessas coisas que o exercício é que faz, de que como quando nos acomodamos com algo que nos parece o melhor e mais fácil é difícil de mudar.

Não sou contra que as pessoas ouçam arrocha e funk, embora Mc Catra e afins são intragáveis para o meu auto determinado refinado QI e bom gosto musical. Fora também porque penso que música também serve para recreação e é assim que vejo essas "canções" (só eu sei o conflito que desenvolvo agora comigo mesmo para se referir assim a aqueles sons ouvidos pelos meus alunos). Porém a inexistência de reflexão que eles, os alunos e a massa da qual fazem parte, tem sobre a qualidade dessa música e a intransigência para se abrir e a pelo menos conhecer outras possibilidades acho de uma burrice tremenda.

Com relação a ação perante aos meus alunos de agora em diante? Vou insistir sempre que tiver a oportunidade com meu gosto musical "ruim" aos seus ouvidos atrofiados. Sei que a muitos não vão mudar e sequer são obrigados a mudar. Pelo menos não poderão falar que alguém, algum dia, escancarou-lhes uma oportunidade de ouvir uma música diferente e melhor das quais eles tanto "apreciam".

Rausto!

quarta-feira, 6 de março de 2013

Democracia de mentira


Hoje houve um fervoroso protesto na Câmara dos Deputados. Os movimentos negro e homossexual se coloram diametralmente opostos à eleição do dep. Marcos Feliciano à presidência da Comissão de Direitos Humanos. Os deputados não conseguiram votar, expulsaram os manifestantes e farão a eleição amanhã,  sem no entanto a participação popular. 

Contradição 1: Marcos Feliciano é racista e homofóbico, faz parte da bancada evangélica, que segue os mesmos princípios, além de ignorar diversidade religiosa e para ganhar apoio mútuo se aliar à bancada ruralista, historicamente envolvida com abusos de direitos humanos como assassinatos de campesinos e trabalho escravo. 

Contradição 2: diz a postergada Constituição da República que a Câmara dos Deputados é a casa do povo, logo todas as pessoas tem direito de se manifestarem e se fazerem ouvir. No entanto as pessoas serão impedidas de irem à votação na Câmara e demonstrarem a sua opinião. 

Contradição 3: nossa democracia tem como principio a liberdade, logo o respeito às individualidades, e o nosso Estado é republicano, isto é, pertence às pessoas. No entanto as pessoas não são ouvidas pelos deputados e são impedidas de falarem quando suas opiniões confrontam os interesses politiqueiros deles.

Fatos centrais: O que existe é um grupo de pessoas se perpetuando no poder e impondo seus interesses pessoais através da democracia, que não existe para todos os cidadãos. Sempre que alguém exigir o que é seu, quem tem mais poder do que outros vai querer furtar os direitos dos outros para não perder seus privilégios. Caso do pastor Marcos Feliciano e seus colegas deputados que barram a participação popular na eleição da CDH.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Quebrando as pernas do Silas Malafaia


Silas Malafaia é um babaca e diz muitas coisas torpes e sem nexo. Uma das coisas que mais me irrita na verborragia dele é a quantidade falácias que ele vendem como se fossem conhecimento científica, coisas todas que não são verdade. Finalmente alguém que lida realmente com a Ciência e todo o conhecimento que ela produz veio a público desmontar as coisas que o referido pastor diz. O cara do vídeo é doutorando em genética e esclarece cada ponto das coisas que o Malafaia distorce, coisa que ele por motivos óbvios não quer ver.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Leve embriaguez!


Ontem fui ao novo bar que vende picanha na chapa aqui no Jardim Novo Mundo, muito embora eu estivesse com uma camiseta de banda de heavy metal as Heinekens subiu a cabeça e comecei a cantar acompanhando a dupla do couvert. Sei lá que música era, sei que falava de beber e eu levemente ébrio ergui a garrafa vazia de cerveja para cantar, o garçom pegou da minha mão e trouxe outra. Eu gostei, é bom ficar ébrio e então meio que sentir que o mundo gira a minha volta! Viva as percas etílicas da lucidez!

domingo, 16 de setembro de 2012

O essencial é invisível aos olhos

Não gosto da morte, ela me causa medo por causa da sua natureza irrefutável. Não gosto da morte principalmente quando ela se mostra presente ou no mínimo próxima das pessoas jovem como eu. Não gosto da morte por ela me lembrar que um dia ela levará embora e para sempre todas as pessoas que um dia eu tanto amei, ou que se eu morrer por esses próximos tempos, morre junto outros tempos depois e de tanta tristeza quem eu tanto amo.

Essa semana a morte me deu um chacoalho e por dentro eu senti frio, apesar dos recordes anuais de temperatura, como de costume acontece em Goiânia em Setembro, ao final do inverno. Havia lido e rapidamente no Facebook que um amigo estava na UTI e a princípio até relativizei. Ele é paciente cardíaco e às vezes seu coração prega essas peças desagradáveis e perigosas, porém, até onde eu lembro, não ao ponto de ir para a UTI. 

No cair da noite eu me distraia com as coisas vãs da internet enquanto me arrumava para ir dar aula. Alguém me disse que o amigo estava na UTI por ter tentado suicídio com superdosagem de medicamentos. Tenso, fui dar aula com o humor mais recatado. Veio a tona aquele medozinho da morte na lembrança de que somos temporários e todas as coisas que fazemos, de que é com ele, mas que pode ser comigo. Se bem que nunca tive vontade de me matar, mesmo nos dias em que eu talvez tivesse alguma justificativa plausível para tal e pudesse me julgar infeliz. Sempre fui covarde ao ponto de sequer me permitir pensar na possibilidade, é porque ter vontade de morrer para mim também é questão de coragem.

Aproveitei a deixa e a vontade que a gente sente de compartilhar com alguém algo que remoemos por dentro e contei à minha mãe sobre o acontecimento, da sexualidade do amigo, da inaceitação de sua família quando ele se revelou, dos revestrés pelos quais ele tem passado nos últimos tempos. Minha mãe também se sentiu mal, acho que porque existem similaridades clássicas na vida de qualquer homem gay cuja família em princípio e no mínimo é ignorante em relação ao assunto. Fora que assim, a possibilidade de um suicídio, mostra bem a quem quer que seja que não é lá as melhores das opções para quem prefere dizer que preferiria chorar em cima do caixão do filho ao invés de tê-lo gay, coisa que minha mãe nos dias da notícia disse.

Pois bem, os dias dessa longa, quente e, sem sombras de dúvidas, desagradável semana se passaram. O amigo teve alta e ontem o fui visitar. Pensei em levar algo para ele que falasse um pouco dos meus sentimentos, algum presente que para ele que pudesse fazer diferença ou algum sentido em um momento de confusão e incógnita, que não fosse assim tão efêmero e o principal, que custasse barato, sabe como é salário de professor. Fui com seu namorado ou, enfim, não sei como meu amigo trata quem vive com ele na casa dele, ao shopping. 

Olhei com um tédio tamanho para as vitrines, eu estava com fome também. E em uma esquina do shopping vi aquele azul peculiar e acelerei o passoe entrei dentro da Livraria Leitura. Pensei em algo no sentido de Maria Bethânia, meu amigo também gosta de Maria Bethânia e isso seria ótimo. Sim, eu não gostaria de dar a ele um presente que eu acho que deveria ser dado primeiro a mim... esse é o meu amor próprio falando mais alto. Mas aí tive uma ideia melhor, perguntei ao vendedor onde estava o Pequeno Príncipe, e ele me mostrou uma prateleira com livros em ofertas na qual havia uma pilha de livros com um garoto de olhos azuis e cabelos amarelos. Achei o preço salgado, como sempre, por um livro de um autor que provavelmente deve estar em domínio público, enfim, depois confirmo isso. Procurei alguma caneta para escrever a dedicatória e achei tudo muito caro até que fui à seção de papelaria e comprei uma Bic Azul Cristal por R$1,00.

Após comida árabe, atravessar longamente a cidade, encontramos o amigo. Rolou beijo gay com o namorado na porta da vizinhança e eu aproveitei a deixa para não fazer papel de lanterna, digo, vela escrever a dedicatória. Não lembro o que escrevi, era simples, mas era sincero, entreguei o livro à ele, que disse que há muito queria lê-lo, só que nunca tivera a oportunidade. Pena a recuperação dele ainda demorar para acontecer plenamente, a visão não permitiu que ele lesse na minha frente a dedicatória. É que gosto de ver a reação das pessoas no exato momento em que elas leem minhas porcarias, como vocês neste exato momento.

Tudo bem, a irmã dele, um tanto quanto histérica começou a ler o livro e falei sobre o desenho do livro que no dia que eu tiver um corpo moreno, sarado, gostoso da cor pecado eu mandarei tatuar na minha barriga. Falei também sobre a raposa e de ficar feliz desde às três  por saber que alguém que gostamos vai chegar às quatro e pensei sobre olhar os dentes de tigre no campo para lembrar do sorriso de alguém, enfim... me senti bobo e caipira... mas gostei de tudo isso hoje.

Agora em casa, são mais de três horas do domingo, faz calor, ventilador ligado, chuva é apenas uma promessa, enquanto a primavera definitivamente não chega. Impossível dormir, dado o calor, a ansiedade e pensar em todas essas coisas dos últimos dias, sejam elas boas ou agradáveis. Bem, sobrou escrever aqui e salvar outra vez, como sempre, o blog do abandono. 

Bem, é isso,

Peixos, me liga.