Assim com a minha mãe não vê na dela, eu não vejo a menor graça na minha vida. Sou pobre, estudo para me formar no que não vai me trazer felicidade, o meu corpo não é o que eu quero, como se não bastasse preciso de uma cirurgia que não sai tão cedo. Carnaval para mim consiste em ficar com meus pais, que ruminam diante da TV, e sentado feito um zumbi na frente desse computador.
É muito, mas muito cedo para eu dizer que vim ao mundo e perdi a viagem. Ainda tenho tempo e não chegou as vezes em que eu vou explorar todas as chances que eu tiver e assim me achar melhor ao Sol. Minha mãe coitada, é diferente, não está velha, mas do jeito que ela escolheu as coisas ela envelhece rápido. Isso me faz sentir dó dela e ainda mais raiva.
Ela só não tem coragem de dizer porque me ama, porém a verdade é que ela me acha um vagabundo. Com 19 anos eu só estudo. Ela dá graças a Deus por eu estudar, mas ela tem mais vontade que eu trabalhe do que estude. Ela tem raiva de muita coisa, raiva d’eu não falar de mulher mesmo que eu não fale de homem. Ela tem raiva de mim, e dela também, porque a pobre egoísta que ela é sem saber acabou transferindo a mim a maior parte dos planos da vida dela, acou se limitando. Ela tem raiva porque eu não acredito em Deus e não vejo a menor necessidade disso. Ela tem raiva de mim porque eu não acho bom senso nela, nem nas coisas que a minha avó ensinou a ela e a coitada pensa que eu tenho que seguir. Ela tem raiva porque eu não tenho raiva da família do meu pai. Ela tem raiva porque eu nada me interesso saber sobre o que os vizinhos fazem da vida deles ou o que foi manchete nos jornais sangrentos.
E eu não tenho raiva? Lógico que tenho, tenho raiva dela ter raiva e não saber do que tem raiva. Tenho raiva dela ser assim. Tenho raiva porque isso me afeta e tenho raiva das probabilidades que faz mãe e filho duas pessoas com trato em relação as situações tão diferentes. Não tenho raiva dela, mas sim das coisas que ela faz ou pensa. Tenho raiva dos elogios feitos a mim devido a vontade de que algo diferente aconteça.
Não quero ficar nessa por muito tempo. Eu quero ser livre, quero a sair daqui assim que puder. Ela vai sofrer, eu também, eu gosto dela e com a distância que verei que gosto dela de verdade e irei me arrepender e só não vou admitir por causa do meu orgulho. Mas confesso, a vontade de realmente testar a existência dessa felicidade é imensa. Assim também como sair de casa para fazer ela chorar.
Desculpa minha mãe se eu não o que você quis e me desculpa também se na razão eu te entendo e o meu amor é apenas latente e nada saliente.
O que me anima é saber que um dia as coisas vão mudar, pois tem que mudar, inclusive o regime de chuvas, quanta raiva eu sinto desses dias quentes semelhantes a agosto. Nem os típicos musgos dessa estação tem nos meus muros.