quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Não evoluímos?

Líamos e comentávamos sobre a notícia de que o Conselho Federal de Psicologia puniu Rozângela Alves Justino, uma senhora que embora uma Universidade tenha dado a ela o título de psicóloga, o CFP pode cassá-lo. Mas o CFP não cassou, deixou Justino continuar a ser chamada de psicóloga e, por assim ser, ser procurada como tal pelas pessoas.

Talvez não seja ético da minha parte pensar que o correto seja tirar o título de psicóloga das mãos de Justino porque não sei o que contém o processo aberto contra ela e muito menos sou psicólogo, de psicologia conheço algo pouco além do senso comum. No entanto me agradaria mais se uma ação mais radical fosse empreendida pelo CFP, uma cassação.

Até agora, eu que sou mero expectador e leigo, fico sem resposta para algumas perguntas. Quais são as teorias que Justino levou em conta para dizer que precisam de tratamento os homossexuais que não querem mais ser o que são? Por assim ser, qual teoria Justino utilizou para elaborar um tratamento para os homossexuais? Essas teorias não foram refutadas por outros profissionais cientificamente? Se Justino não se baseou totalmente em teoria alguma, que método científico ela usou para chegar aos diagnósticos e tratamentos?

Mas penso que nenhuma dessas perguntas sejam necessárias, deveria eu perguntar se Rozângela Alves Justino utilizou algum método científico verdadeiramente e não, pelo que apresenta a mídia, apenas os preceitos morais e religiosos dela.

Fica claro também que para muitos dos que apoiam a mulher do Rio de Janeiro processada pelo CFP, pouco importa o método científico. Para quem apoia aquela senhora o que importa são as crenças - para mim superstições, e a moral - tão relativa conforme a cultura, sociedade e tempo - que foram utilizadas por ela para elaborar diagnósticos e tratamentos.

Porém não é necessário a mim ser psicólogo para saber que a Psicologia é ciência e, por assim ser, os profissionais da área são cientistas por lidarem com ela. Assim, quem apoia a manutenção de Justino como psicóloga deve levar em conta isso. Então não me preocupo nesse caso com a opinião do grande público que, pelo que indica, julga na maioria absoluta das vezes com senso comum (moral e superstição). Me preocupo nessa hora com a opinião de quem está no Conselho Federal de Psicologia. Tomara eles terem agido então levando em conta o que a Ciência exige, pois não vejo coerência em deixar continuar psicólogo quem usa de senso comum.

Lembrando que senso comum tem em qualquer lugar e se dependesse nesse caso de senso comum não precisariamos de psicólogo, sou arrogante ao dizer que eu me bastaria.

Ao mesmo tempo me sinto violentado, pois sei que não sofro de nenhuma doença, desvio ou outra categoria cujo significado não domino por não ser psicólogo, que me faz ser homossexual. E me sinto um tanto quanto derrotado sabendo que pode ter sido sorte minha ter parado no consultório de uma profissional que me auxiliou no meu processo de autoconhecimento e autoaceitação, mostrando a mim que os problemas em ser homossexual não pertencem a quem é em muitos casos. Mostrando que as vezes os problemas pertencem a quem não é e não consegue lidar com isso, talvez porque também é um homossexual.

Me sinto irritado também por causa desses sujeitos que se fantasiaram de heterossexuais, não para a sociedade, mas para eles próprios e foram para a porta do CFP protestar contra a ação do órgão. Evidentemente acabamos desenvolvendo uma afeição pelo profissional que nos acompanha e certamente fica mais difícil questionar algo que ele diz, pois pressupomos que o que aquela pessoa nos diz é sempre verdadeiro. Mas essas vítimas de Justino são responsáveis pelo próprio fracasso também.

Como homossexual não me entra na cabeça que alguém consiga dar mais credibilidade a um laudo técnico - que embora não deva ter, não é garantido que não tenha nenhuma manipulação como a dogmática e moral que parece ter acontecido no caso de Justino - do que a própia consciência. Comparo um laudo que me diz doente por ser homossexual a um laudo que tenta me convencer que não existo, que o quê penso, sinto, vivencio não existe, que eu nunca existi.

Outra coisa que é incomoda são os comentários que refletem e repercutem o que parte da opinião pública embebida e perdida no senso comum está a pensar da situação. Confundem, conforme li em comentários de reportagem, a censura que sofreu Rozângela Alves Justino com falta de democracia e não com um órgão em nome de centenas de profissionais querendo organizar e dar credibilidade a profissão que possuem. Assim também como não acham antidemocrático alguém que deve ser imparcial impor, de forma sútil, aos outros suas crenças e valores.

Incomoda também o ingênuo e raso pensamento, acreditando que o homossexual infeliz com sua CONDIÇÃO tem o direito de se curar (sic) e procurar Justino para tal. Em uma comunidade compararam um homossexual nessa condição a um obeso que procura um endocrinologista. Obesidade é um estado e de fato é um mal, a homossexualidade é um condição, que acredito inerente ao indivíduo desde o nascimento, e não é uma doença. A homossexualidade é apenas uma, às vezes a infeliz, condição que a ignorância e o fundamentalismo fariseu das pessoas as impedem de aceitar.

Então tolerar que uma pessoa use a autoridade que uma profissão confere para enganar pessoas é comparável a quem mata outra pessoa, culposo ou dolosamente, quando a "vítima" queria suicidar.

Também não entendo porque a homossexualidade incomoda tanto aos heterossexuais, se é que são realmente heterossexuais. Que critério utilizam os cristão para relativizar o que a sua Bíblia diz sobre questões como incesto, escravidão, guerras, sacrifícios e não a homossexualidade, ou homossexualismo como preferem, palavras que sequer existem na Bíblia greco-romana?

E dá medo também quando olho para o peso que a religião ainda tem em nossa sociedade e o desejo dela para se infiltrar, novamente, em um Estado, que prentende e deve ser laíco. Há quem veja isso como importante, mas se não determos pessoas como a bancada evangélica no Congresso e as atitudes como a greve de fome de padres e bispos contra o aborto, abriremos precedentes para quê, com o discurso que se utilizar e da forma que se utilizar, tenhamos no futuro uma democracia de mentira como a do Irã.

Religião e Estado não devem se misturar, ainda mais em um país em que as pessoas não leem, em que as pessoas acreditam que Política, assim como Religião e Futebol, não deve ser discutida, em um país cuja Educação é conteúdista e não qualitativa, em um país que conforme o discurso as pessoas mudam facilmente de opinião.

Dá medo quando vejo mensagem de apoio de evangélicos, católicos querendo inclusive articularem contra a ação do Conselho Federal de Psicologia. Dá medo, pois eles acreditam que um órgão oficial e regulamentador, a exemplo de todo Estado e de toda sociedade, deve atender aos preceitos morais e dogmáticos de sua facção religiosa, a cristã, por essa ser a dominante. Dá medo porque não se deram conta que não são a totalidade e que não é porque são maioria ou acreditam em algo, os demais indivíduos e as instituições devam se sujeitar aos preceitos deles.

Então, não evoluímos?