Falar para eu mesmo que sou gay foi complicado porque gay não significava apenas quem gostasse de pessoas do mesmo sexo. Embora fosse repetido e eu tentasse acreditar, ainda tinha comigo a imagem de que gay é mais do que é isso, aliás, é menos do que os outros, que gay é inferior.
E sabido, pelos padrões sociais que são empurrados, que temos que ser perfeitos, dentro daquilo que é colocado pelas instituições, pela publicidade, que diga-se de passagem é uma coisa que faz mal e está serviço dele, e pelo consumo como perfeito. Na construção do impõe como pessoas perfeitas, coisa que tento alcançar as vezes sem me dar conta, não entra o homossexual, apesar que tenham aí um discurso dissonante, mas ainda sim mínimo querendo mudar isso.
Pronto, agora assumi para mim que sou gay, mas acabei admitindo para mim também que sou inferior no fundo também. Na verdade não assumi que sou gay, admiti que sou bissexual, porque é menos pior, apesar que de mulher mesmo nunca tivesse eu gostado e nunca fui bissexual, também decidi que não faria amizades com pessoas do “meio”, não deixaria ninguém saber disso e por aí vai. Conforme vou incorporando que não é inferior, vou evoluíndo, conto para terapeuta, que já sabia é claro, para amigos, pais, e alguns lugares públicos pouco me importa saber se os outros vão entender isso, que eu sou homossexual mesmo, na maior parte do tempo passivo.
Fazer Libras foi também uma realização pessoal na qual serviu também para eu fazer todas essas reflexões que coloco nesse texto. Não que eu não soubesse disso tudo que estou escrevendo aqui, é que eu não tinha sistematizado para mim mesmo do modo claro que até eu entendesse, o que faz com que eu conclua que o processo de auto-observação e auto-entendimento é delongado e contínuo.
Aos poucos fui me conhecendo e aos poucos fui perdendo o medo que tive de mim, porque passei aos poucos a me entender. Com surdos, com cegos, com pessoas com deficiência mental, cadeirantes e tudo mais é a mesma coisa, apesar que penso que auto-aceitação, pelo menos para aqueles com deficiência nativa, não tenha sido o caso.
Mas no fundo quando pensamos nessas pessoas, mesmo que queiramos ser inclusivos, somos preconceituosos, porque temos medo de magoá-las e não entendê-las como é o meu caso. Mas ainda bem que posso me dar ao luxo de ser racional usando dessas emoções que me vêm agora, revolta, vergonha, orgulho, satisfação, medo, inconformismo, porque assim posso me dar conta do quão limitado eu é que sou e como se aprende a cada a instante.
Não não não! As melhores lições não são essas que estão escritas em longas dissertações, teses, artigos, livros, palestras e tudo mais. As melhores lições são essas que se assemelham à Libras, as que de tão simples que são acabam se tornando complicadas serem percebidas, aprendidas como os seus sinais e gramática, que se assemelham à essa reflexão que fiz e que certamente não estava na ementa da disciplina.
Aliás, porque estou escrevendo isso? Pouco importa. Estou atrasado para o lançamento do livro da Vaca Profana.