Porque estou escrevendo esse texto aqui, não sei bem. Me sinto um urubu com uma pegada de Datena fazendo isso, mas quinta-feira, no ponto em que desço e na hora do almoço uma aglomeração de pessoas existia. Uma ambulância do corpo de Bombeiros permanecia no local e umas viaturas da Polícia também.
O que as pessoas olhavam era o que estava sobre o chão, no caso uma motoclicleta despedaçada debaixo do caminhão da empresa de energia e abraçado à roda dele, um corpo empalidecido. O capacete era rosa mas não dizia muito, já que o tempo do rosa fazer alguém menos homem já deve ter passado, pergunte à revista Veja.
O corpo se vivo estivesse seria bonito, aliás, não é morbido falar, eu acho, que o rapaz morto no chão era bonito. Trajava uma regata preta daquelas tipo mamãe sou forte, tinha pêlos e uma medalha no pescoço, sem contar que era jovem como eu. Foi isso o que deu para ver. Me senti um grande urubu quando corrigi a moça ao meu lado, que fotografava com o smartphone que tinha de crédito ou bônus o mesmo de alma e respeito da dona, e disse que a Polícia estava esperando o IML e não a Defesa Civil.
Bem, fiz muitas coisas na quinta e na sexta-feira. Mesmo assim fico pensando no corpo estendido no chão. Será humanidade da minha parte. Pode até ser, embora ninguém naquela hora estivesse se colocando como humao. E fica até dramático quando penso na propaganda do Estado, a maior parte das mortes são de homens e jovens. Também penso na família, na mãe mais exatamente recebendo a notícia de que o filho morreu. Penso no velório, na vida após a morte do que se foi.
Também penso e se fosse comigo. Fico irritado porque fico deprimido por causa do infeliz desconhecido que morreu. Grito bem alto os hits com obsolecência programada da Beyoncé. Faço assim porque dá a sensação de que para a inveja do defunto, que não saí da minha cabeça creio que por ser bonito, estou vivo. Mesmo assim é deprimente. Tanta juventude, tanta beleza, tanta coragem, tanta discussão por pouca causa e no final se morre.
A morte e os impostos, diria algum economista que não me lembro quem, são as únicas coisas na vida que podemos contar.
É e a gente acorda pensando nisso todo dia agora e fica chateado. Tão bonito, tão jovem, talvez eu pudesse conhecê-lo um dia qualquer e ele fizesse falta para mim também. Mas também bem feito. Ninguém mandou cortar o caminhão pela direita, ainda mais numa moto que para sorte dos que velaram a ele era 125 cc.
Bem, sei lá porque escrevo isso. Acho que semana que vem já passou. De qualquer maneira uma música do Gabriel o Pensador que colocam no curso da autoescola para nunca fazermos burrada no trânsito e não morrermos ninguém, principalmente nós.