quarta-feira, 19 de maio de 2010

Um dia de cão

Eu tentei uma vez, tentei outra vez, tentei mais outra vez. Tentei ser legal, ser palhaço, ser sério, carrancudo, mas não deu certo. Levando o data-show para a secretaria da escola lá estão um monte de gente, coordenador pedagógico, secretária chefe, coordenadora de turno, diretora e perguntam outra vez em unissono:

- Eaeh?

E eu digo:

- Amanhã (no caso hoje – data dessa postagem) eu faço 21 anos, ou seja, se eu começar outra graduação que não tenha nada a ver com educação eu ainda vou me formar novo.

- Estamos falamos, eles (os alunos) massacram.

- Lá na Universidade é tudo bonito, agora você acredita que aqui é diferente.

- Não tem jeito, eles não querem aprender.

Coitado de mim. Pobre menino sonhador, acordou para a vida. Não quero admitir, mas os alunos são realmente alunos. Bando de filhos da puta, sem luzes. O pior que o mais filho da puta e sem luz sou eu, quatro anos praticamente em uma Universidade, lendo tanto, pensando tanto e não dou conta de dar um jeito nos guris. Os alunos são uns filhos da puta, mas não tanto quanto eu. Que fiasco, não conseguir dar uma aula que preste é um fiasco. Será que se eu fosse um médico deixaria o paciente morrer?

Estava assistindo hoje a tarde os capítulos que faltavam de Glee para entrar em sincronia com a exibição da série. Lá pelas tantas do episódio 18, o telefone fixo toca. É pap ligando, adoro ID de chamada. Por causa disso nem atendo telefones cujo DDD comece com 4 ou 5. Sempre é algum separatista lá do Sul vendendo assinatura de revistas ou cartão de crédito em troca de um salário mínimo de fome.

- Pai.

- Cadê sua mãe?

- Pondo roupas na máquina.

- Vem aqui no Hospital [/a barriga do Well vai glaciando progressivamente] de Urgências me buscar, porque eu caí da moto!

- Tá, mas e você, como está? [/voz meio tremula]

- Não, estou bem, mas preciso ir para outro hospital. Vem logo! Mas cuidado como vai falar para a sua mãe!

Quando meu pai fala que está bem, mesmo que ele não esteja necessariamente bem como queríamos, dá para respirar aliviado. Meu pai é muito prático, só diz que está com dor quando estar com dor. Não tem nada com ele que não pode ser resolvido com um pouco de palavras. Ele é um ótimo adepto de o que não tem solução, solucionado está. Vou puxá-lo nisso eu acho.

- Mãe, não fica preocupada, meu pai caiu da moto, está tudo bem, ele disse para eu ir lá pegar ele no hospital. [/sorriso “Olá, vamos fazer seu cartão Hipercard hoje?” style]

- [/minha mãe incorporando a Maria do Bairro] Como assim está tudo bem? [/eu fazendo cara de Soraya Montenegro na parte que ela diz: “Calma Maria do Bairro”] Ele está bem?

- Está, estou indo lá oh, peixos me liga!

- Eu vou com você.

- Aí meu coo, você vai enrolar.

- Eu vou, é meu marido! E a moto?

- Mandou lembranças?

- O quê?

- Ah, num sei, liga para o meu pai e pergunta, depois que sairmos!

E assim foi o dia lindo, com os capetas da escola, alunos carrascos e funcionários para dar apoio moral, e os capetas do serviço público de saúde. Que coo, vai para classificação de risco, consulta com médico, tira raio X, consulta com médico de novo, toma injeção, faz curativo, põe atadura. Aproveito e ligo na Vivo para comer o cu deles ou os 30.000 pontos de volta. Faço cara de dózinha para aqueles adolescentizinhos munitinhos que vão chegando com a mãozinho, o pézinho quebradinho, torcidinho, deslocadinho, luchadinho, e penso, tão bonitinho, tão dodói, deve ser outro filho da puta que fode com a vida e a autoestima profissional do professor.

Saímos lá do pronto socorro ortopédico as 22:30. Eu cansado, chateado, minha mãe ligando para família nos quatro canto do estado para dar notícias, o rádio ligado na CBN e eu pensando, como essa vinheta é melhor do que ouvir a mesma história pela quinta vez. Por fim, resta passar no pit dog e comprar uns X-tudos.

Enfim, feliz 21° outono Well.

P.S.: Por mais que quem eu deseje ganhe as eleições, continuarei não confiando na Previdência Social. O que é melhor, VGBL ou PGBL?