terça-feira, 9 de março de 2010

Sobre um trauma da infância ou a Educação da Autonomia

Ontem me lembrei de um trauma da infância. Na pré alfabetização a professora levou até nós folhas de papel A4 nas quais estavam desenhadas espigas de milho. Deveriamos pintar as folhas da espigas desenhadas de verde, eu quis pintá-las de bege porque na chácara do meu avó eu vi uma espiga de milho com folhas beges, na verdade secas. A professora gritou comigo, ela era muito brava, e disse que eu era louco porque não existia espiga de milho bege. Todos meus colegas riram de mim e eu fiquei com vergonha.

Ok, eu pintei então as folhas da espiga de milho de verde claro com contornos em verde escuro. Enquanto fazia isso, a professora passou por todas carteiras deixando pedaços de papel amarelo que deveriamos cortar com os dedos pedacinhos, embolá-los e colá-los nos pontinhos da espiga de milho. Tudo bem, eu fiz assim e ela disse que o meu estava ficando bonito. Nossa, finalmente o louco recebeu um reforço positivo!

Então a professora saiu e foi buscar fica crepe, aquela fita adesiva que se parece com papel e pode ser cortada no dedo, porque ela ia colar nossas espigas no mural da escola. Eu tinha um caixa de giz de cera e queria usá-los, então peguei o giz de cera vermelho sangue e contornei ao redor da espiga de milho um coração que ficou bem torto. Na volta a professora foi pegando os extratos do suprassumos das criatividade dos aluno, sem luz era o que ela pensava que nós éramos. Quando ela foi pegar o meu, ela fez aquela cara feia de novo, apareceram um monte de rugas na testa dela, ela gritou e fui molhado pelo cuspi venonoso dela dizendo que não ia colar a minha espiga no mural porque ela ficou feia.

Guardei o meu desenho, doravante feio e que não merecia ser colado no mural da escola. Cheguei em casa e coloquei o desenho num canto escondido qualquer porque aquilo era uma coisa vergonhosa. Um dia qualquer minha mãe foi arrumar meu quarto e quando chego da escola…

!!!!!!!!

…lá estava a minha espiga de milho das folhas verdes contornada com um coração torto com giz de cera vermelho e quera era feia para ser colada no mural da escola pregada na porta do guardarroupas. A exposição daquela espiga na porta do meu quarto me envergonhava.

Perguntei a minha mãe porque ela havia feito aquilo e ela disse que achava tudo que o filhinho lindo dela fazia lindinho demais. Como assim lindinho? Minha mãe não entende nada de beleza. Aquilo era feio, minha mãe e nem a vizinha, as minhas tias, as minhas primas grandes que iam até o meu quarto e dizia que tava bonito, não entendiam de beleza. Eu morria de vergonha daquilo porque a professora que me ensinava as coisas certas disse que estava feio.

Quando a professora falou que a minha espiga estava feia, achei ela uma vaca, feia, velha e gorda que deveria morrer no trilho do trem e queria ver se ela falasse aquilo para mim se eu fosse um cavaleiro do zoodíaco ou o Machine Man. Bem, hoje, após ter entendido que aquela professora era tradicional, feito minhas críticas a esse modelo e ter lido Vigostsky, Piaget, Paulo Freire e outros caras legais que sabiam como é que se faz, não penso mais na professora como uma vaca, feia, velha e gorda que deveria morrer no trilho do trem e queria ver se ela falasse aquilo para mim se eu fosse um cavaleiro do zoodíaco ou o Machine Man.

Penso nela apenas como uma feia, velha, gorda e tradicional.

Peixos, me twitta @BorbaGabriel.