Sou usuário do sistema de transporte público e costumeiramente viajo sozinho. Existem, é claro, os outros passageiros, mas assim como eu, eles ficam recolhidos na própria individualidade ou com outros falando sobre nascer e morrer da mesma forma que em Panis et Circenses, o que não é o meu caso.
Recolher-se a própria individualidade é sinônimo de muitas ações, como empurrar feito um bovino os outros na hora do embarque ou não ceder lugar a quem mais precisar – coisas que não são minhas práticas, até ficar introspectivamente olhando a paisagem.
Só que pensar como aquela paisagem foi construída fica chato. Melhor então variar, que tal pensar em outras coisas? Eu tentava pensar, mas toda vez que ficava introspectivo não dava certo, a sexualidade reclamava que eu não dava atenção para ela, perguntava até quando ia ser assim, onde eu desejava chegar, indagava se não era mais fácil encarar as coisas de uma outra maneira, arriscar mais.
Enfim, ficar introspectivo foi um saco por causa da encheção de saco da minha sexualidade. Nem precisava eu embarcar em um ônibus, o simples fato de ir sozinho até a estação já era suficiente para tudo aquilo começar. Enfim, essa menina colorida degradê me venceu pelo cansaço. Aceitei aderir, aos poucos ao discurso dela. Viajar de ônibus para Universidade ficou mais agradável a partir daí.
Mas sabe, posso dizer que andar de ônibus foi fundamental para a aceitação da minha homossexualidade. Porque ficar introspectivo, ouvir os próprios pensamentos e sentimentos foi virando rotina, foi ficando chato, foi ficando irritante e os meus pensamentos e sentimentos têm um forte poder de persuasão sobre mim, quando eles querem, eles me convencem. Mas deixa a minha geopolítica interna.
Como já disse, chegou uma hora que eu me cansei daquela e rotina e daí como forma de espairecer resolvi observar os rapazinhos que estivessem ali, no mesmo ônibus que eu. Assim então pensei é melhor ser gay mesmo, porque realmente homem é muito agradável de se olhar, resta saber como é na prática. Eu resolvi simplificar a minha vida, mesmo não sendo cliente Oi. Hoje digo que andar em ônibus me faz sentir vivo e pode acreditar, é relaxante, divertido e inspirador.
Faz-me sentir vivo por, entre muitas coisas, deixar o meu falo excitado quando alguns sujeitos entram ali no bólido semovente para massas, pois sei que se estou me excitado é porque estou vivo, além de ser um viado. E pensar sacanagens, escanear os gestos e os corpos, me dá mais convicção sobre a existência da razão, aqui entendida como pensamento, e dos meus desejos cristãomentes perversos. Ainda bem que sou ateu daí.
Apesar do empurra, dos atrasos, da superlotação, dos crentes berrando suas crenças, que são muitas vezes inerentes as viagens de ônibus e que faz com que eu pense que esteja em uma narração simbolista, sim porque me sinto um animal comprovando a teoria da evolução de espécies assim, me divirto. É interessante ficar olhando as figuras que entram no ônibus, às vezes dá até para nutrir esperanças.
Mas esse que é o problema, perder a noção da brincadeira e nutrir esperanças. Hoje mesmo comecei a comer com os olhos um boyzinho muito bonito. Ele deve ter uns dezenove anos, adora bermudas e por a mostra os pernas peludas, que eu curto demais, e um jeito bem jovial. Repará-lo estava sendo um baita dum entretenimento, estava até me excitando em ficar ali de pé olhando ele sentadinho olhando a paisagem da janela lateral.
Eu estava excitado então, mas foi perdendo de forma gradual e sensível o vigor quando o ônibus foi lotando e chegou uma racha muito da boasuda, coisa que não curto de jeito algum, e se aproximou ali de nós dois e vi como ele olhava o corpicho que o papai e a mamãe dela deu a ela. Então, eu tinha ouvido pela manhã Paisagem na Janela, mas ver aquele ato de heterossexualidade por parte dele foi como se a minha música fosse parando de tocar como naquelas cenas em que tudo desaafiiinnaaaaa.