Lá se vão os seis primeiros meses do ano que parece ter começado há pouco tempo. Enquanto não vêm os meses que dão a sensação de passar mais rápido ainda, os do segundo semestre, fico refletindo sobre os que já passaram. Não é o caso de se comemorar e nem de se lamentar, mas de olhar o que valeu ou não a pena.
Dia 08 de Julho irei completar seis meses da abertura da porta do meu armário aos meus pais e no embalo para algumas pessoas importantes também. Ainda lembro bem e com algum desprezo da hora em que estava neste computador assistindo De Porta em Porta, típico filme estadunidense tosco falando de vencer barreiras e ganhar dinheiro, quando minha mãe me aparece com uma carta do Mário dizendo para não receber mais cartas de homens porque pegava mal.
Pegava mal... não era daquela hora que minha mãe inconscientemente me pedia a verdade. Sem saber ela me pedia a verdade quando sonhava por mim casando com mulheres, tendo filhos com elas e dizendo isso toda hora como se quisesse cobrar ou querer que eu falasse alguma coisa. Os sonhos que a mim são pesadelos asquerosos, mesmo que eu esteja acordado escrevendo em um blog. Ela me pedia a verdade quando se sentia superior e se referia aos outros como aquele viado, aquela bicha e daí olhava para mim se orgulhando por não ter um filho assim. Minha mãe me pedia a verdade muitas vezes e de formas diferentes.
Minha mãe pedia a verdade e eu contei sem que ela estivesse preparada. Respirei fundo, a sudorese nas mãos e nos pés aumentou, assim como o frio na barriga e os batimentos cardíacos. Era incógnito o que viria doravante. Mas foi até anestesiante quando um espírito vingativo entrou em mim e me deu mais coragem para revelar a ela o que iria dizer.
Vingança é pesado para formação que a maioria de nós teve e não pensem que eu odeio ou não amo minha mãe. Mas naquela hora quis me vingar das cobranças dela, do jeito dela impor as vontades dela, da forma dela agir sem consultar aos outros e saber se eles querem, por se entusiasmar com incertezas.
Mas não era só me vingar da minha mãe, era me vingar de tudo, por viver tantos anos escondido com medos dos preconceitos que inegavelmente existem e que não é agradável ser vítima deles. Por isso acho nobre quem se esconde em um armário e desprezo os arrogantes que militam chamando aos armariados de covardes por não darem a cara a tapa. Ninguém tem as mesmas atribuições e nem a obrigação messiânica para com uma causa e todos tem direito de viver seus processos em paz.
Falei a minha mãe de uma forma firme, cínica e sem ser agressivo que iria receber cartas de quem eu quisesse e não me preocupava se era de homem ou mulher, já que sou gay mesmo. Não foi bem nessas palavras, porém o espírito do que eu quis dizer foi esse. Minha mãe começou um choro constrangedor, que iria durar dias. Pediu-me naquele momento que eu a iludisse dizendo que era mentira, mas eu não menti, eu disse a verdade.
Na onda ganho convicções mais forte da M como um anjo e de sua mãe como uma segunda mãe. Encanto-me ao mesmo tempo em que me espanto com a sabedoria e candura dos meus avós que vieram até minha casa, semana depois de os vê-los em sua casa no interior, para mostrar que a vida não é como se pensa... à minha mãe.
Ao longo desses dias nunca postei tanto nesse blog e nunca pensei que ele pudesse ser uma terapia tanto para mim, como para outros, tão eficiente. Ao longo dos dias não senti raiva, mas no fundo uma mágoa que a razão impediu vivê-la. Minha relação com minha mãe ficou então mais fria e seca além do que era antes. Nesses dias vi o tempo como alguém sábio, que a tudo resolveria e a quem eu podia pedir clemência. E deu certo, cheguei a essa conclusão semanas depois e agora depois de seis meses tenho mais certeza ainda.
Minha mãe aprendeu que controlar a mim com choro não é eficiente, às vezes ela tenta ainda, mas sofre em vão.
Sair do armário em casa e para mais algumas pessoas é positivo, pois dá para viver com mais transparência, apesar de que ninguém tem que saber os detalhes do que faço. No entanto não é muito diferente de antes. Continuo escondido, prefiro a descrição, às vezes negação da minha sexualidade conforme quem perguntar.
Não nego que sair do armário aqui me faz ter agora outras necessidades como alguém para ouvir Ana Carolina comigo, se ele gostar de Ana Carolina, e que com quem possa trocar carícias e fazer com ele as coisas mais íntimas que os sentimentos deixarem. Nutrir por ele os sentimentos mais avassaladores, nobres e a mim pouco ou nada conhecido. Nesses dias, diante da frieza dos textos científicos me dá uma carência disso, uma saudade do que não vivo. Mas deixa, vou confiar outra vez no tempo que tratará de tudo resolver.