terça-feira, 19 de agosto de 2008

Da Matriarca

Minha mãe, não sei porque mas tem hora que a senhora me irrita com umas perguntas e suas explicações. "Pega a panela no armário". Será que é só eu que percebi que aqui em casa tem tantas panelas em tantos armários? "Sabe aquela minha amiga daquele dia?" Eu posso tratar como "aquele dia" qualquer dia antes de hoje. E amiga, a senhora tem tantas.

Mas suas descrições genéricas a respeito das pessoas, das coisas e dos eventos não é o que me irrita. E nem o videocassete, agora (alguns aninhos) o leitor de DVD, a parabólica que está aqui em casa a tanto tempo e ainda sou requisitado para trocar de canal, por legenda, por para gravar a novela.

Também não me irrito tanto com a lentidão com que anda. O mal gosto para comprar roupas para mim. O tanto de bugigangas que põe no meu rack. As vindas da missa nas quais fala mal da vida de alguém por mais que eu não queira ouvir.

Me irrita para caramba quando a senhora fala "Aquele menino viado", "Quando você casar", "Os meus netos, que ainda vou ter." Eu não sou mal por gostar do que gosto e não deixo de ser quem você pensa que eu sou na essência por causa disso.

O que custa perceber que as coisas não é como eu quero? É tão dificil ver que eu não quero o mesmo que a senhora? Por que eu não me sinto seguro? Por que você reclama tanto? Se apega ao que é dos outros e não faz diferença alguma para nós? Por que você não me dá segurança? Tem que me fazer sentir tanto medo assim?

Somos dois errantes, mas estamos tentando acertar. Alguém de nos encontrou ou está encontrando o melhor caminho para aproximar-se da inatingível perfeição. Mas o que é a perfeição a não ser uma idealização que nossos desejos elaboram, algo que vai da intenção de cada?

O dia em que você saberá da minha boca o que eu gosto vai chegar. Sair frustada e caída só dependerá de você. Sair frustado e caído não dependerá de mim. Não sei quando será, mas vou me preparar para que tudo dê certo para mim.

Mas sem esquecer que eu amo muito a senhora. O jeito como mexe com o mão é único e já me dá suspiros de respeito, amor e tudo mais. É linda a doação que faz por mim e por meu pai, e é as vezes exagera. Doe-se para mim quando eu precisar de contar algo e a senhora ser para a mim um porto seguro.

A senhora é uma boa pessoa apesar dos erros. Eu por mais ranzinza, por mais arrogante, por mais impaciente, por mais que não seja aquele filho munido de condura também sou. Tentemos fazer o nosso amor incondicional não ser dominado pela vaidade que eu tanto quanto a senhora temos descontraladamente.

3 comentários:

Anônimo disse...

Nenhum de nós é aquilo o que o outro espera - exceto na fase do encantamento que é o momento no qual encarnamos o perfeito.
As mães são seres humanos como nós, imperfeitos, falíveis, entediantes, e, ao mesmo tempo, ENCANTORES, AMÁVEIS E ESSENCIAIS.
Com elas vivemos um relacionamento - como acontece com qualquer outro ser humano - que passa pela descoberta, aprofundamento, desgate, fim ou renovação. Porém, com as mães, há a cumplicidade do cordão umbilical que parece nunca se romper.
No fundo, temos muito medo de perdê-las, de não contar com o seu colo, do afago em nosso cabelo, de escutar a sua voz e o seu modo de nos chamar pelo nome completo ou por um apelido carinhoso que só ela usa. Mas o temor da perda não pode enevoar a verdade...
Sua mãe NUNCA o deixará só. Vai parecer que ela está sofrendo pela revelação da sua opção sexual, por vergonha. Mas não é nada disso... Ela sabe que o mundo é cruel... Ela tentará com o seu sofrimento poupar que você sofra, numa tentativa - até desesperada - de sofrer por você, evitando tudo o que você terá de enfrentar para se firmar em uma sociedade, ainda, tão preconceituosa.

Abraços, querido. Meu profundo afeto por sua mãe e por você.

O Well Bernard disse...

Olá amigo (sumido). Bem, eu concordo com você. Mas enfrentar uma possivel situação como a revelação da minha condição sexual vai onerar muita coragem, paciência, perseveransa. Não sei se tenho esses requisitos por agora e nem quando os terei. Sou muito dependente emocionalmente daquela mulher.

Franjo Labaskevic disse...

Cara,

Eu penso o seguinte. Uma mãe pode tudo, menos deixar de amar um filho. Se ele é gay e ela é homofobica, ela vai sofrer mas vai amar, afinal amor materno é incondicional.

Ela sabe, mesmo insconcientemente o quanto você é dependente dela, e por te amar é que vai te acolher mesmo que isso seja pra ela uma grande dificuldade no início, depois vai ser tão normal porque o instinto materno é que sempre triunfa no final.

Abção!